domingo, 21 de janeiro de 2018

OS CAMINHOS DESAPARECERAM DA ALMA HUMANA

“Caminho: faixa de terra sobre a qual se anda a pé.
A estrada distingue-se do caminho não só por ser percorrida de
automóvel, mas também por ser uma simples linha ligando um
ponto a outro. A estrada não tem em si própria qualquer sentido;
só têm sentido os dois pontos que ela liga.
O caminho é uma homenagem ao espaço.
Cada trecho do caminho é em si próprio dotado de um sentido
e convida-nos a uma pausa.
A estrada é uma desvalorização triunfal do espaço, que hoje não
passa de um entrave aos movimentos do homem, de uma perda
de tempo. 
Antes ainda de desaparecerem da paisagem, os caminhos
desapareceram da alma humana: o homem já não sente o desejo
de caminhar e de extrair disso um prazer.
E também a sua vida ele já não vê como um caminho, mas como
uma estrada: como uma linha conduzindo de uma etapa à seguinte,
do posto de capitão ao posto de general, do estatuto de esposa ao
estatuto de viúva.
O tempo de viver reduziu-se a um simples obstáculo que é preciso
ultrapassar a uma velocidade sempre crescente.” 

(Milan Kundera, in "A Imortalidade") 
[Escritor, Republica Checa, n. 1 Abr 1929]

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