terça-feira, 2 de setembro de 2014

SEJAMOS ALEGRES

“Denuncio nossa fraqueza, denuncio o horror alucinante de morrer
— e respondo a toda essa infâmia com — exatamente isto que vai
agora ficar escrito — e respondo a toda essa infâmia com a alegria.
Puríssima e levíssima alegria. A minha única salvação é a alegria.
Uma alegria atonal dentro do it essencial.
Não faz sentido? Pois tem que fazer. Porque é cruel demais saber
que a vida é única e que não temos como garantia senão a fé em
trevas — porque é cruel demais, então respondo com a pureza de
uma alegria indomável.
Recuso-me a ficar triste.
Sejamos alegres.
Quem não tiver medo de ficar alegre e experimentar uma só vez
sequer a alegria doida e profunda terá o melhor de nossa verdade.
Eu estou — apesar de tudo oh apesar de tudo — estou sendo
alegre neste instante — já que passa se eu não fixá-lo com
palavras.
Estou sendo alegre neste mesmo instante porque me recuso a
ser vencida: então eu amo. Como resposta.
Amor impessoal, amor it, é alegria: mesmo o amor que não dá
certo, mesmo o amor que termina.
E a minha própria morte e a dos que amamos tem que ser alegre,
não sei ainda como, mas tem que ser.
Viver é isto: a alegria do it.
E conformar-me não como vencida mas num allegro com brio.” 

(Clarice Lispector, in 'Água Viva')

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