sexta-feira, 31 de outubro de 2014

OS CAMINHOS DESAPARECERAM DA ALMA HUMANA

"Caminho: faixa de terra sobre a qual se anda a pé. A estrada distingue-se
do caminho não só por ser percorrida de automóvel, mas também por ser
uma simples linha ligando um ponto a outro.
A estrada não tem em si própria qualquer sentido; só têm sentido os dois
pontos que ela liga.
O caminho é uma homenagem ao espaço. Cada trecho do caminho é em
si próprio dotado de um sentido e convida-nos a uma pausa.
A estrada é uma desvalorização triunfal do espaço, que hoje não passa de
um entrave aos movimentos do homem, de uma perda de tempo. 
Antes ainda de desaparecerem da paisagem, os caminhos desapareceram
da alma humana: o homem já não sente o desejo de caminhar e de extrair
disso um prazer. E também a sua vida ele já não vê como um caminho,
mas como uma estrada: como uma linha conduzindo de uma etapa à
seguinte, do posto de capitão ao posto de general, do estatuto de esposa
ao estatuto de viúva.
O tempo de viver reduziu-se a um simples obstáculo que é preciso
ultrapassar a uma velocidade sempre crescente." 

(Milan Kundera, in "A Imortalidade")

Um comentário:

  1. Olá VERA,

    a obra eu já conhecia , mas não me lembrava desta estupenda e definitiva diferenciação que ele faz entre os caminhos e as estradas humanas e seus reais sentidos,significados e significâncias.

    Como felizmente tenho você entre os meus blogues que sigo,sempre saio lucrando muito mais do que você e com toda a certeza, pois, nesta troca de informações, muito pouco tenho a acrescentar à sua bagagem intelectual.

    Um abração carioca.

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